Desumanização: o caso de Charlie Kirk
Como a ideologia sequestra nossa humanidade e nos transforma em peças de um jogo que não controlamos
Eu estava interessado em falar dos últimos acontecimentos envolvendo Charlie Kirk. Se você está desatualizado das notícias, um militante conservador americano foi morto em praça pública, e isso provocou no mundo uma onda de debates políticos entre esquerda e direita.
Me espantei com os comentários que li, principalmente porque ficou evidente que as pessoas opinavam sem conhecer Charlie Kirk de fato, inclusive a mídia, analisando a situação como quem tem dois neurônios.
Primeiro, me incomodou a fala de que o homem foi "morto" ou sofreu um "assassinato". Isso é pouco. Quem realmente assistiu o vídeo não falaria assim. Presenciamos uma EXECUÇÃO em praça pública que deveria chocar qualquer pessoa com um mínimo de humanidade.
Segundo, vimos pessoas de esquerda comemorando abertamente a morte brutal de alguém que rotulavam como "fascista". Do outro lado, parte da direita já declarava o homem um "mártir" e pedia vingança.
No meio dessa confusão toda, existe uma família destroçada. Não sei se você viu as fotos da família, mas agora filhos crescerão sem pai e uma esposa perdeu o companheiro. Seres humanos reais, com dores reais, reduzidos a peças num tabuleiro político. Houve até um pastor americano que disse algo como: "Sim, o assassinato foi terrível, mas ele era racista". Esse "mas" após uma execução revela tudo - um artifício retórico para inflamar sentimentos, provando que até líderes religiosos podem ter sua compaixão sequestrada pela ideologia.
Mas será que não foi o próprio Charlie Kirk que causou tudo isso? Esse é o tipo de pergunta que comprova que muitos pensam com dois neurônios em um caso tão triste.
Quem era Charlie Kirk
Charlie Kirk era um ativista conservador americano de 31 anos, fundador da organização Turning Point USA, que atuava principalmente em universidades promovendo ideias conservadoras entre jovens. Durante anos, defendeu posições que muitos consideravam controversas, alinhando-se frequentemente com o establishment republicano e certas pautas neoconservadoras.
Sim, sempre considerei algumas ideias de Kirk ridículas, problemáticas e repugnantes. Mas a maioria das pessoas que comemoraram sua morte nem sabiam suas opiniões de fato. Na era das notícias rápidas, infelizmente as pessoas formam opinião definitiva sobre qualquer assunto em questão de minutos.
Contudo, algo interessante vinha acontecendo recentemente - e isso nenhum grupo de direita ou esquerda comentou: Kirk parecia estar encontrando seu caminho. Começou a questionar algumas posições anteriores, especialmente sobre o envolvimento americano em conflitos internacionais e o apoio irrestrito a determinadas políticas externas. Era um evangélico bem conservador, mas sua esposa católica o influenciou a frequentar as missas, e isso exemplificava seu processo de revisão de crenças.
Mas em 16 de setembro de 2025, durante um evento universitário em Utah, Kirk foi executado por um atirador a longa distância (identificado por alguns como sendo Tyler Robinson, de 22 anos). O vídeo da execução mostra a brutalidade do ato: um tiro certeiro que o matou instantaneamente diante de centenas de pessoas. Não foi crime passional ou acidental - foi uma execução calculada e fria de um homem que repensava publicamente suas convicções.
O veneno que corre nas duas direções
A desumanização não é privilégio da esquerda nem da direita. É a ferramenta preferida de qualquer ideologia que precisa de inimigos para sobreviver, e o caso Kirk exemplifica perfeitamente esse mecanismo.
Quando a esquerda transforma Kirk num "fascista", apaga o homem por trás das ideias. Não importa que estivesse questionando posições anteriores, que tivesse família, que fosse um ser humano complexo em processo de mudança. Ele vira apenas um símbolo a ser eliminado. Comentários celebrando sua morte proliferaram nas redes sociais, tratando-o como se fosse apenas uma ideia ruim que finalmente foi "cancelada" fisicamente.
A direita comete o mesmo erro inversamente. Ao transformá-lo instantaneamente em "mártir", santifica alguém que defendeu posições problemáticas, ignorando que Kirk também foi vítima de uma captura ideológica que o impediu de enxergar certas verdades. A canonização política é tão desumanizante quanto a demonização
O resultado é idêntico nos dois lados: Charlie Kirk deixa de ser uma pessoa para se tornar ferramenta política. Enquanto isso acontece, Tyler Robinson, o jovem de 22 anos apontado como atirador, também é reduzido a um símbolo - ora do "terrorismo de esquerda", ora da "radicalização online". Ninguém pergunta como alguém dessa idade chegou ao ponto de considerar a execução de outro ser humano uma solução aceitável.
A máquina de criar inimigos
O filósofo chileno Juan Antonio Widow (1935-2024) tinha compreensão profunda de como a ideologia funciona. Widow observou que a ideologia opera como um vírus mental que sequestra nossa inteligência e humanidade. O ideólogo, segundo ele, abre mão da própria capacidade de pensar e deixa que a ideologia pense por ele.
O processo é sempre o mesmo:
Redução: O outro lado não são pessoas, são "fascistas", "comunistas", "racistas", "degenerados"
Justificação: Qualquer ação contra eles se torna moralmente aceitável
Desumanização: Eles não merecem nossa empatia, compaixão, nem humanidade
Foi assim que chegamos ao ponto de pessoas normais comemorarem execuções em praça pública. Foi assim que chegamos ao ponto de pastores colocarem "mas" na compaixão cristã. A máquina ideológica transformou seres humanos em categorias abstratas que podem ser odiadas sem culpa.
O que você não percebe sobre si mesmo
Aqui está a verdade incômoda: você provavelmente está sendo manipulado exatamente da mesma forma.
Pense nas últimas vezes que se pegou desejando o mal de alguém por causa de suas posições políticas. Pense em como reage quando vê notícias sobre a morte ou desgraça de figuras públicas que considera "do outro lado".
Se sentiu uma pontinha de satisfação, se pensou "bem feito", se sua primeira reação foi lembrar dos "pecados" da pessoa antes de sentir compaixão humana básica, então a ideologia já fez seu trabalho em você.
A máquina de desumanização não distingue espectro político. Ela pega conservadores e progressistas, evangélicos e ateus, brasileiros e americanos. Ela os transforma em soldados de uma guerra que não escolheram, lutando por interesses que não são seus.
Quem ganha quando você odeia
Enquanto você está ocupado odiando o "inimigo" que a ideologia criou para você, quem realmente se beneficia?
As empresas de tecnologia que ganham mais dinheiro quanto mais tempo você gasta online consumindo conteúdo polarizador. Os políticos que se fortalecem criando "outros" para você temer. As corporações de mídia que vendem soluções para problemas que elas mesmas ajudaram a criar.
Mesmo a cobertura obsessiva sobre quem era o possível atirador Tyler Robinson, tentando descobrir seu "lado político", alimenta essa máquina. Os noticiários e redes sociais lucram com hashtags, audiência e o ciclo infinito de indignação. Cada clique numa matéria sobre "o perfil ideológico do atirador" gera receita para alguém.
Charlie Kirk, Tyler Robinson, você, eu – todos somos peças descartáveis nesse jogo. A única diferença é que alguns descobrem isso tarde demais.
O caminho de volta à humanidade
Jesus Cristo ofereceu o modelo perfeito de como tratar até mesmo aqueles que nos opõem. Quando estava sendo crucificado, Ele não disse "Pai, perdoa os meus discípulos, mas não os romanos e judeus opressores". Ele simplesmente disse: "Pai, perdoa-os, porque não sabem o que fazem." Os primeiros cristãos levaram isso a sério - mesmo sendo perseguidos, torturados e mortos, continuaram vendo seus algozes como pessoas criadas à imagem de Deus, necessitadas de redenção, não de vingança.
Isso significa:
Ver pessoas como pessoas, mesmo quando discordamos profundamente delas
Manter a compaixão mesmo diante de ideias que consideramos abomináveis
Reconhecer a complexidade em vez de buscar vilões simples para problemas complexos
Defender verdades sem desumanizar quem as rejeita
Não é moderação. Não é relativismo. É humanidade básica enraizada na verdade bíblica.
A única guerra que importa
Existe, sim, uma guerra espiritual acontecendo. Mas não é entre esquerda e direita, conservadores e progressistas, Trump e seus opositores, Bolsonaro e Alexandre de Moraes, ou Lula e seus críticos.
É entre aqueles que querem preservar nossa humanidade e aqueles que lucram com nossa desumanização. Entre quem enxerga a imago Dei - a imagem de Deus - nas pessoas e quem as reduz a números estatísticos ou símbolos políticos.
A Bíblia é clara: "Não matarás" (Êxodo 20:13). Mas Jesus vai além: "Todo aquele que se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento" (Mateus 5:22). O ódio que antecede a violência física já é, em si, uma violação da lei de Deus. Quando celebramos a morte de alguém ou promovemos o mal a nossos "inimigos" políticos, já participamos da mesma lógica que levou à execução de Charlie Kirk.
Conclusão: O preço da lucidez
Reconhecer que talvez fomos manipulados é doloroso. Admitir que nossas reações emocionais foram calculadas por outros é humilhante. Perceber que podemos ter perdido nossa humanidade em nome de uma "causa" é devastador.
Mas também é libertador.
Quando paramos de ser peças no tabuleiro de outras pessoas, podemos finalmente começar a viver nossa própria vida. Uma vida onde pessoas são pessoas, onde a verdade importa mais que a vitória política, onde nossa alma vale mais que qualquer ideologia.
Meu comentário é simples: fuja da intriga ideológica e política. Vá para a Igreja buscar a Deus. Invista tempo de qualidade com sua família. Dedique-se ao seu trabalho com excelência. Cultive amizades verdadeiras baseadas em afeto genuíno, não em alinhamento político.
As coisas que realmente importam estão bem na sua frente: o abraço dos seus filhos, a conversa sincera com um amigo, a oração silenciosa, o trabalho bem feito, o relacionamento restaurado. Enquanto o mundo se consome em ódio ideológico, você pode escolher construir algo real e duradouro.
Atualizações 🚨
Estou pensando em fazer uma mudança em nossa newsletter. Há mais de um ano escrevo semanalmente para vocês, mas venho refletindo sobre a possibilidade de oferecer um texto adicional por semana. Vocês receberiam dois conteúdos: um mais devocional, refletindo sobre uma passagem bíblica para aplicação em nosso dia a dia, e outro mais reflexivo como este, tratando de questões diversas que envolvem nosso seguimento a Jesus neste mundo complexo. O que acham dessa ideia? Respondam nos comentários.
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Victor Romão.